segunda-feira, 28 de julho de 2008

Escrever ...

Texto disponível em Cronópios

A Literatura e o curso de Letras
Por William Lial

Não é de hoje que escuto e leio comentários sobre a Literatura e o curso de Letras, em que esse último traria um prejuízo ao primeiro. Vários são os motivos encontrados para evitar ou desmerecer a Faculdade de Letras. Vozes das mais diversas e mais distantes de saber o que é essa faculdade se manifestam contra sua “influência negativa”. Entretanto, devemos ter cuidado com o que afirmamos, principalmente se nunca fomos, nem assistimos a alguma aula desse curso, o que tornaria muito suspeita qualquer crítica.
Muitas dessas críticas são bastante infundadas, tais como: “o curso não faz bons escritores”, “ninguém se torna um bom escritor depois de fazer o curso” ou “tenho medo de ser contaminado dentro do curso e ter meu talento prejudicado”. Mas uma coisa deve ficar clara: o curso de Letras não é nem foi feito para formar escritores. Este não é seu objetivo. Trata-se de um curso para formar críticos de Literatura, pessoas capacitadas para avaliar e interpretar melhor um texto, analisar e descobrir seus pormenores, além de certos estudos de aprofundamento em gramática, mas jamais teve o objetivo de formar escritores. Quem pensa em fazer Letras para se tornar ou se aprimorar como escritor, não faz idéia do que se trata o curso. O aprimoramento pode ser alcançado por você mesmo, lendo bastante e se aprimorando construindo um texto atrás do outro até encontrar o seu caminho. Um escritor não se forma em academia, se forma por si mesmo e pelas influências de suas leituras.
Falando agora exclusivamente do curso pelo curso, claro que existem os professores ruins, péssimos, eu diria, como em qualquer área, mas também há os bons. A academia não é o que poderia ser, é verdade, contudo o aluno também faz parte dela, se ele se esforça, se estuda, se exige, muitos professores trabalharão melhor. Lembro-me de quando eu era aluno, na faculdade, e muitos de meus colegas diziam não ter dinheiro para comprar os livros literários necessários para o semestre; no entanto eu os via no fim de semana gastando horrores com bebidas e vagabundagens. Todos tem o direito de beber num fim de semana, até recomendo, faz bem e é ótimo jogar conversa fora com os amigos e se divertir; mas nesse caso não se pode dizer que não tem dinheiro para comprar livros. Tudo é uma questão de prioridades: beba um pouco menos e compre um livro. Obviamente eu sei que existem alguns que realmente não têm dinheiro para comprar nada, nem livros nem cervejinha. Mas, claro, não é desses que falo.
Quanto à forma das aulas, elas ocorrem de diversas maneiras, não necessariamente são aquela coisa extremamente hermética em que o professor fala, o aluno escuta, os textos são apresentados apenas como objetos de estudo, desprovidos de emoção e prazer de leitura, os termos técnicos são expostos e o aluno tem que engolir, como se Literatura fosse um objeto feito para se analisar friamente e dele descobrir termos e nuances técnicos apenas. Isso não é inútil, mas não é a única forma como a Literatura é estudada. As aulas também são apresentadas em forma de conversa, quase um sarau, onde se pega um texto e lê-lo com os alunos, depois discute sobre seu contexto histórico, sua temática, o que se aprendeu com ele, como ele o surpreendeu e lhe causou emoção, e então, depois, quando muito se tiver falado sobre ele, analisa-se os dados mais técnicos. O que torna a aula mais divertida e profícua. Uma aula também é o momento em que se conversa e troca opiniões e idéias, um momento para onde os alunos podem ter prazer em ir porque acreditam que vão descobrir coisas novas, falar e expor o que sabem e aprenderam, fazendo da Literatura algo vivo e contínuo, e não um pedaço de realidade antiga que parou e ficou no tempo passado.
Faço esse comentário porque sei que, apesar dos problemas das universidades, esse tipo de aula ainda existe. Tive professores assim, e eu mesmo sou assim com meus alunos, gosto de ouvi-los, gosto de uma aula onde vou ter com quem conversar sobre algo que tanto me apaixona, como leitor e como escritor.
Quanto à questão de que a crítica é algo nocivo, prejudicial ao texto, algo sem vantagem, isso fica a cargo do julgamento de cada um. Creio que a crítica, no sentido de análise, como é um dos objetivos do curso de Letras, é válida para quem ver nisso um prazer, para quem gosta de descobrir outras coisas além do texto, desde que não se distancie demais – para tudo há um limite, e nesse caso não seria diferente, pois quando muito se distancia, cria-se outra realidade, outro texto. Mas se você não vê graça alguma em pormenorizar um texto, se seu prazer se dá apenas na leitura deleitosa, lúdica, ótimo, o importante é que você encontre a sua felicidade junto aos textos – mas se for assim, não faça Letras, como já citei, há outros objetivos lá.
Enfim, quanto ao curso de que falamos poder contaminar e prejudicar o seu talento, fique tranqüilo: se você tem certeza de seu talento e de que quer escrever, a faculdade não vai lhe atrapalhar, você saberá usar o que lhe será útil; somente os que não têm consciência de seu talento podem ser influenciados deficientemente. Lembre-se do que disse Rilke, pois é isso que mais faz diferença:


“Entre em si mesmo, busque a necessidade que o leva a escrever, examine se tem raízes no mais profundo de seu coração. Confesse a si mesmo: morreria, se lhe fosse proibido escrever? (...) Sou realmente obrigado a escrever? Se a resposta é afirmativa, (...) então construa sua vida segundo esta necessidade.”RILKE, Cartas a um jovem poeta


3 comentários:

  1. Oi passei por aqui!!!

    Bju

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  2. É verdade, concordo total! O curso de letras é para formar teóricos e não escritores. Claro que o curso vai fazer o aluno ler mais, ser mais crítico e provavelmente isso vai fazer com que seu texto melhore também.
    beijcas

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  3. Agora deixo aqui a minha opinião como acadêmica de letras:
    Na realidade vai de cada aluno absorver mais sobre cada aula.
    Se meu foco é a escrita : sim, eu posso me beneficiar e muito do curso de Letras, lembrando que não é lá que se aprende a escrever bem.
    É uma grande ferramenta para melhorar a escrita, aumentar a visão sobre a literatura.

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