sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Porque não se lê poesia?

Um texto super interessante de Carpinejar:

Por que não se lê poesia?
Por Fabrício Carpinejar

Já pensou em escrever um romance?" A pergunta, em tom levemente depreciativo, é despejada sobre a cabeça do poeta a cada novo livro. A resposta negativa gera no in....terlocutor do poeta uma tosse ou um constrangido balançar de rosto – ainda mais porque aquele que perguntou provavelmente nem leu a obra em questão. O engasgo soa algo como encontrar uma amiga, olhar para seu ventre, cumprimentar pelo bebê que irá nascer e receber de troco a afirmação seca, cruel: não, eu não estou grávida.
Há o julgamento informal de que poesia é perda de tempo. Tendo lançado até agora dois livros, não cheguei ao ponto de receber os pêsames, mas não falta muito para isso. Até porque o poeta é identificado como um defunto comercial e nunca será de bom tom dar as condolências ao próprio falecido. Mas, afinal, por que todo esse preconceito quando o assunto é poesia?

A resposta mais fácil estaria na baixíssima taxa de compra de livros no Brasil. O índice é de 0,8 livro não-didático por habitante/ano. Como ninguém leva um livro pela metade, não se chega a adquirir um volume inteiro, ficando longe de países como os Estados Unidos (sete livros por habitante/ano). Sobrariam para os versos as migalhas. O Prêmio Jabuti de Literatura, o mais importante do país, concedido pela Câmara Brasileira do Livro, seria outra prova desse desinteresse. Nesse ano, apenas 63 livros foram inscritos na categoria poesia, 40 a menos dos 103 inscritos no ano passado. Nas livrarias, a seção de poesia dorme em algum canto obscuro, longe do alcance da visão dos leitores.
Todos esses dados seriam suficientes para indicar que o brasileiro não gosta de poesia. Será? O curioso é que boa parte das pessoas costuma iniciar-se na literatura por meio da poesia, seja em cartas, seja em cantadas extra-literárias para conquistar alguém. Mas o adolescente que se empenha em comover seu par é o mesmo que acha difícil a interpretação poética. Esse é o paradoxo: os poemas são considerados fáceis de fazer e complicados de ler. Como isso? Para muitos jovens, ainda vigora uma idéia romântica de criação. Poesia é pura inspiração, acessório para colocar em cabeçalhos de agenda. Faz parte do kit básico de sedução, ao lado das flores e do ursinho de pelúcia dado para a namorada.

Esse adolescente é o mesmo que tem horror à obrigatoriedade de ler os chamados poetas clássicos nas aulas de literatura – tudo para conseguir passar no vestibular. Aprende datas, o nome dos movimentos, mas não se inspira na leitura dos autores. O conjunto é resumido nos esquemas das escolas literárias e o texto em si termina relegado a um papel secundário. Toda trajetória de um escritor é abreviada a uma fria questão de vestibular. Sobretudo, o sujeito aprende que todos os bons poetas fazem parte do passado, culminando com a geração modernista de 1922 e uns poucos da primeira metade do século XX. Você já percebeu que não há praticamente nenhum poeta consagrado desde então, conhecido e lido como Drummond ou João Cabral?
Por que poesia virou mercadoria que todo mundo tem para vender mas ninguém quer comprar? Como foi que os leitores perderam o interesse pela poesia? Desconfio que a resposta esteja no fato de que os próprios poetas tenham perdido o interesse pelos leitores. A poesia como um exercício de linguagem, fria, escrita para agradar os professores de semiótica, torna-a cada vez mais distante do interesse dos leitores. Enquanto a poesia narrava uma história, era capaz de ser atraente, compreensível e proporcionar entretenimento, os poetas eram populares. E isso não era sinônimo de sentimentalismo barato, como o ato de despejar emoções no papel sem uma preocupação com a estrutura. O poeta era o equivalente a um músico, que tocava palavras como cordas de um violão.

Não é à toa que foi na melhor MPB que os jovens continuaram procurando versos que não encontram na chamada poesia contemporânea. Fora daí, ela passou a ser encarada de duas formas: a sentimentalista, à base de trocadilhos fracos, ou a acadêmica, difícil, culta, que atende a interesses universitários e não chega aos ouvidos da gente. Para sair desse impasse, talvez seja a hora de os poetas voltarem a contar histórias. É preciso fugir da armadilha que impõe que a boa poesia seja um exercício de linguagem e que qualquer poeta disposto a narrar a vida das pessoas seja etiquetado como menor. Não foi o público de poesia que desapareceu, como querem alguns teóricos da literatura. O que desapareceu foi a poesia em contato com a vida das pessoas. Talvez ela esteja adormecida, esperando que alguém traga de volta o simples prazer de ler um poema.

6 comentários:

  1. Passei para te desejar um bom e diveretido fim de semana.
    Quanto aos poemas , bom já deves ter reparado que não escrevo poemas , apenas tento :)...mas estou feliz assim

    Beijo

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  2. Façam tardes as manhãs
    Façam artes os artistas
    Faça parte da maçã
    A condenação prevista
    Façam chuvas os Xamãs
    Façam danças as coristas
    Façam votos que esta corda
    Não sabote o equilibrista

    Façam Beatles "For No One"
    Faça o povo a justiça
    Faça amor o tempo todo
    Que amor não desperdiça
    Faça votos pra alegria
    Faça com que todo dia
    Seja um dia de domingo

    Façam tardes as manhãs
    Façam artes os artistas
    Faça parte da maçã
    A condenação prevista

    Façam Beatles "For No One"
    Faça o povo a justiça
    Faça amor o tempo todo
    Que amor não desperdiça
    Faça votos pra alegria
    Faça com que todo dia
    Seja um dia de domingo

    (Osvaldo Montenegro)

    Votos de um lindo final de semana
    Um abraço

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  3. Ótimo e propício texto do Carpinejar.

    Adoro poesias ainda que não saiba poetizar.

    As poesias me tocam profundamente. Derramo-me e encanto-me com os versos dos poetas (conhecidos ou desconhecidos).

    Beijo,
    Inês

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  4. Ola meninas,
    pois 'e , tambem adoro poesias e por isso coloquei esse artigo. 'e interessante refletir sobre a leitura desse genero literario.. at'e porque as escrevo..

    abracos a todos e bom final de semana.
    * desculpe acentos errados.. teclado doido!

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  5. Muito bom saber a opinião de Carpinejar. Pelo menos entendo e me conformo com as estatísticas. Mas como a última postagem sua foi sobre Clarice e estive em repouso por uns dias resolvi reler "A HORA DA ESTRELA". É uma narrativa profundamente poética, profunda e linda como só a Clarice sabia fazer. Fernando Pessoa também entrecortava textos e poemas. Amo ler e perde aquele que não consegue sequer interpretar semanticamente os versos de "Construção" do nosso Chico Buarque, ou mesmo dividir em estrofes o nosso Hino Nacional e interpretá-lo.

    Muito bom, Beatriz! Estou aprendendo e gostando a cada vez que venho aqui.

    Beijos, amiga

    Mirze

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  6. Oi Mirze,
    Fico feliz em saber que de alguma forma tenho trazido informacoes interessantes aos visitantes do blog.
    um grande abraco

    Beatriz

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